A internet me mudou e me moldou ao longo dos anos.
A primeira vez que tive acesso a internet, eu tinha menos de 8 anos, no comércio do meu avô, entrava no site da Turma da Mônica, da Barbie e no chat uol.
Nenhuma regularidade, quando eu estava lá e o computador estava desocupado.
Além de brincar de colorir eu queria conversar, me comunicar com pessoas sem sentir vergonha, sem me preocupar com o meu peso, se estavam prestando atenção na minha barriga.
A primeira vez que fui ter o meu computador e pude fazer tudo que eu queria, eu tinha uns 11 anos, mais ou menos na mesma época em que menstruei pela primeira vez. Toda minha puberdade passada dentro de uma caixa de luz. Cheia de gente mais velha que se sentia muito a vontade pra julgar e ter muitas opiniões sobre pessoas mais novas, às vezes, bem, bem mais novas.
Mas a minha ansia por comunicação não passava. Eu gastava horas, dias e semanas. Todo assunto me interessava, eram tantas coisas pra aprender, meu cérebro nem dava conta. Tantos novos jeitos de ser, coisas pra ouvir, filmes pra ver, eu emergi no universo cibernético que escolhi como se fosse minha única vida.
E por fazê-lo, de repente a minha vida real tinha menos graça, então fui passando cada vez mais e mais tempo da minha vida real em função da digital, comecei a conhecer pessoas pessoalmente, que antes eu só conhecia na internet, diversas, me dava bem com todas. Pelo menos no começo.
E a internet revolucionou a forma como eu interagia com as pessoas, agora eu tinha tempo pra pensar no que dizer, eu podia tentar ser mais agradável, fazer só as piadas com graça, eu podia não me colocar para baixo ou me preocupar com a minha aparência. Eu podia só tentar ser uma versão mais legal de mim mesma. E eu me afeiçõei a essa versão.
Eu sabia que eu não era a Fernanda que morava na internet, mas eu queria ser. Lá eu me sentia querida, eu entendia as pessoas, porque lá eu não tinha nada pra ler além de palavras.
Lá se alguém era cruel comigo, não dava pra mascarar com uma risadinha.
Eu entendia ou humanos de lá, ou pelo menos eu acreditava que entendia.
Não sei quem eu seria hoje se nunca tivesse conhecido esse mundo alternativo. Não consigo imaginar ter nascido com tudo isso já disponível.
A quantidade de pedófilos que interagiram comigo ao longo dos anos, é um milagre que nada de pior tenha acontecido. Sorte.
Tive muita sorte e muito azar com tudo que me aconteceu pelo meu constante uso de internet.
Adquiri um vício extremamente difícil de se desvencilhar de.
E um monte de experiências caóticas. Outras maravilhosas.
Equilibrio está em tudo.